Educação se faz discutindo!

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O Núcleo de Análise e Crítica da Educação [NACE] é um espaço aberto para discussão e publicação de textos e opiniões acerca das diversas realidades educacionais em voga. Mais especificamente, é a junção das nossas percepções sobre educação submetidas aos comentários sempre construtivos de companheiros e companheiras que também tenham interesse no tema. ____________________________________________________________________________________ Para publicar seu texto, envie para praquemestudar@gmail.com. Pedimos a colaboração de todos na publicação de textos sem conteúdo ofensivo. ____________________________________________________________________________________ Também pedimos, acima de tudo, a participação nos comentários dos textos que já estejam publicados: lembremos que o NACE é um projeto de discussão, e não de engrandecimento particular. Vale ressaltar ainda que o NACE não é vinculado à nenhuma instituição, não concede bolsas e não tem fins lucrativos.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A Arte de Envelhecer - por Bianca Nogueira Mattos

A oficina “A arte de envelhecer” acontece toda semana, as quartas-feiras na Unati, Universidade Aberta a Terceira Idade da Unesp, Campus de Franca. Ela objetiva promoção de qualidade de vida, autonomia, liberdade, socialização de conhecimentos e participação política a partir da criação, conhecimento e interpretação de obras artísticas.

As reuniões acontecem com os alunos unatianos e a estagiária do Serviço Social, Bianca N. Mattos, com o auxílio da estagiária Cristiane Poltroniei, e buscam respeitar os princípios éticos da profissão (rompimento de práticas burocráticas, aproximação usuário-profissional, perspectiva tranformadora, defesa do acesso a direitos e informação, relações horizontais, incentivo a participação política) assim como alguns direitos constitucionais (liberdade de expressão, participação política, educação continuada, cultura, lazer, informação).
A estética faz parte do homem em sua essência, é um elemento fundante do ser humano genérico e a arte é uma de suas ferramentas, assim como as atividades lúdicas, que facilitam o aprendizado e possibilitam maior abertura dos integrantes de um grupo para participarem e construírem juntos um objetivo maior, de interesse comum, ou seja, trazer sentido a atividade educacional ou sócio-educativa, como sugere a educação crítica de Paulo Freire.

O trabalho artístico constitui-se também como mecanismo de expressão e acontecerá com os instrumentos da pintura, do cinema, do teatro/teatro de fantoches, da música, da fotografia e da literatura, debatendo temas como questão de gênero, liberdade, família, questão social, movimentos e lutas sociais, saúde, dentre outros.
Na primeira aula, com duração de uma hora e meia, foram apresentados a princípio os objetivos do curso e o plano de aulas, de forma aberta, esclarecendo a possibilidade de alterações de acordo com a realidade dos participantes. Seguidamente foram trabalhados conceitos de arte como método educativo, como direito universal e como constituinte humana. Foram apresentados os sentidos que podem apreender a arte e as diferentes formas de arte, assim como a proposta de educação horizontal e crítica e da liberdade de expressão como fundamental para a cidadania, para a amplitude do ser e para a efetivação da democracia.

Temas como ditadura, censura, repressão e relatos de experiências desses períodos no Brasil foram levantados a fim de questionar esses sistemas e a importância da liberdade e da arte como expressão de sentimentos, idéias, relevâncias sociais e manifestos.

Outro aspecto enfocado na aula foi o direito universal a informação, pois essa é constituinte no exercício da democracia e da cidadania. Consideramos também a arte como mediadora de informação.

Exibimos um curta-metragem intitulado “O Semeador Urbano” que discorre sobre fotografia e meio-ambiente.

O gênero artístico trabalhado na presente aula foi o visual, contemplando fotografia e artes plásticas. Os alunos produziram telas individuais abstratas e concretas, enquanto escutavam música clássica (Bethoven, Mozart, Chopin). Eles próprios analisaram a música clássica como promotora da imaginação, da sensibilidade e das emoções. Também declararam que a atividade os fazia pensar na sociedade e em como nos esquecemos de nós mesmos nas atuais condições de estresse, trabalho alienante e cansaço, onde a população se preocupa mais com aspectos individualistas e com o consumo e adquirem valores transmitidos pela mídia e pelo próprio cotidiano imposto, do que com suas próprias percepções, vontades e relações pessoais.

Pretendemos, em alguma próxima aula, realizar a pintura de um mural, de forma coletiva, para ilustrar a identidade do grupo e propiciar a atividade cooperativa e o rompimento com o individualismo exacerbado que vivenciamos atualmente.

Por fim, trabalhamos um pouco com a fotografia, que os alunos analisaram de grande importância, pois muitas vezes têm dificuldades de participarem de algumas situações cotidianas por não terem tido ainda aproximação com algumas tecnologias, hoje bastante usuais.

Foi interessante a discussão sobre a fotografia não apenas como retrato da realidade, mas também como manifestação artística, passível de relevância social, desde o momento da escolha do objeto a ser fotografado até a técnica e escolha da captura da imagem.

Os alunos e as estagiárias tiveram um diálogo bastante aberto, que excedeu as expectativas iniciais. Os unatianos apreciaram a amplitude de seus imaginários a partir da técnica de pintura, pois o ideário muitas vezes é abandonado na sociedade do capital onde o trabalho deixa de ser parte da gênese humana e sustentável e passa a ser alienado, explorado, imposto e fetichizado.

Na segunda aula da oficina “A Arte de Envelhecer”, foram elencadas obras nacionais e internacionais, para serem objetos de reflexão e interpretação de todos os participantes.

As obras foram contextualizadas historicamente, sendo considerados os períodos em que foram produzidas e qual a realidade social deles.

Foram analisadas as relevâncias sociais de cada pintura, incluindo suas manifestações sentimentais subjetivas e representação explícita de cultura cotidiana e entraves sociais.

Os artistas estudados na aula foram: Cândido Portinari, Pablo Picasso, Gustav Boulanger, Edvard Munch, Daumier e os muralistas do Muralismo Mexicano, Diego Rivera, José Clemente Orozco e Davi Alfaro Siqueiros.

A partir das imagens, evidenciamos, coletivamente, o caos da guerra, as mudanças climáticas, a desigualdade de classes, a desigualdade de gênero e etinia, a defesa do Estado laico, a defesa e democratização da cultura local e a repressão do Estado sobre a expressão política do povo.

O enfrentamento ao preconceito de diversas categorias (racial, sexista, homofóbico, classial) instaurados na sociedade atual, foi também debatido.
Ainda assim, a principal discussão foi acerca da importância de reflexão e questionamento da própria realidade em que estamos inseridos e do que nos é apresentado por esta, e do reconhecimento do ser humano genérico, da categoria humana e da identidade coletiva social.

Alguns sentimentos foram despertados nas alunas, segundo declaração das próprias alunas, dentre eles o de revolta, angústia, aflição, alegria, romance, desespero, encontro pessoal e solidão.

No quadro de Edvard Munch, O Grito, por exemplo, uma das alunas declarou ter interpretado que o personagem gritava consigo mesmo, buscava por si próprio, já que estava num lugar que lhe dava impressão de distante e isolado e declarou ainda que esse sentimento lhe despertava identificação, pois muitas vezes se sentia dessa forma.

As pinturas que mostravam a repressão feminina e a desigualdade de gênero tocaram o ínfimo das participantes, que começaram a refletir sobre situações atuais de preconceito de gênero e a debater sua origem e instauração na sociedade, além de suas formas de combate e enfrentamento.
Por fim as unatianas disseram que a aula superava suas expectativas, pois ia de encontro com o conhecimento continuado e não subestimava o idoso como incapaz, limitado ou descartável, como muitas vezes é visto pela sociedade.

Na terceira aula nos apropriamos da música como método e teoria. Composições de nomes como Raul Seixas, Geraldo Vandré, Chico Buarque, Zé Ramalho, Caetano Veloso, Gabriel Pensador e o grupo Face da Morte foram escutadas e debatidas.

Refletir sobre a mensagem explícita e subjetiva das canções instigou um diálogo acerca de educação, efetivação dos direitos da população, ditadura, democracia, desigualdade social e sua conseqüente desigualdade de oportunidades, tentando desmistificar a culpabilização do indivíduo e a criminalização da pobreza.

Um dos pontos que devem ser destacados das atividades é o de que os alunos declararam que as oficinas têm sido divertidas e construtivas. Momentos em que o aprendizado ganha sentido e acontece de forma prazerosa e desejada.

Concluímos assim que as atividades possibilitam grande crescimento para todos seus participantes, tanto alunos quanto estagiárias e tem atingido, assim, seus principais objetivos.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Heterogeneidade ou sobrepeso?

Saludos a todxs;
achei um interessante post no blog do Stein Coval [http://steincoval.zip.net/] e achei que seria bom colocá-lo aqui para apreciação. segue, e espero comentários...
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Escrito por Fabiano Stein Coval às 16h08

Correio Popular, 08/07/2010

Opinião
Trilema de Münchhausen

FABIANO STEIN COVAL

A expressão trilema de Münchhausen refere-se, conforme teorizado pelo filósofo Hans Albert, à impossibilidade de fundamentarmos o conhecimento, ou seja, toda tentativa de fundamentação ou justificação do saber é esforço em vão, pois resulta em: 1- uma regressão infinita, 2- um argumento circular ou 3- uma suspensão arbitrária do raciocínio. Assim, teríamos três opções igualmente inaceitáveis (daí o trilema) para justificar qualquer proposição. Münchhausen, célebre barão mitômano que se salvou de um pântano puxando a si mesmo pelos cabelos, indica que as “fundamentações últimas” do saber não passam de fantasias.

Todavia, não é desse instigante problema filosófico que falarei neste artigo e, sim, de como um trilema semelhante pode ser vivenciado no âmbito da educação por professores.

Em uma sala de aula há, via de regra, três tipos de estudantes: os alunos ótimos, que gostam, não da escola ou dos professores — que normalmente são chatos mesmo —, mas de estudar, do aprendizado em si mesmo, encantam-se com descobertas e sentem-se felizes com a solução de um problema complexo, a conquista do reconhecimento por bom trabalho. Trata-se do aluno que, antes da escola, aprendeu em casa que estudar é importante.

Uma segunda classe de alunos — a maioria — compreende aqueles que simplesmente “estão na escola”, passam pela escola porque “faz parte” do processo, alguém o mandou para lá e, mesmo que não tenha sido empurrado para os bancos escolares, acabou por aceitar que precisa estar lá. Trata-se de um ato mecânico, inconsciente, sem o menor significado. Esse tipo de aluno nem gosta nem odeia a escola, ou às vezes gosta e outras vezes odeia, pois sua vida escolar, assim como sua vida social e familiar, não é mais do que um “tanto faz!”.

Finalmente, há os alunos mais famosos da escola, o baderneiro, o indisciplinado, o que flerta com a marginalidade (ou já está bem enfiado no mundo do crime), o que barbariza e vandaliza, o que pratica bullyng, o que tem como ídolos os analfabetos que enriqueceram jogando futebol ou apresentando programas televisivos para outros analfabetos, o que se orgulha de ser ignorante e defende a esperteza como meio de ascensão social. Ascensão que normalmente jamais deixará de ser uma ilusão confusa.

Isso tudo é fruto da universalização do acesso à educação, da qual não é politicamente correto falar contra e nem é esta minha intenção. O fato é que, diante desta realidade, o professor encontra-se sem saída, diante de um trilema:

1- se dá mais atenção aos bons alunos e “cobra” na medida da capacidade deles, aprofundando as matérias das aulas de tal modo que efetivamente capacite tais estudantes para vestibulares e concursos ou, no mínimo, permita a tais estudantes crescer cada vez mais, estará condenando a maioria dos alunos medianos do segundo tipo a um nível de complexidade e exigência incompatíveis com sua problemática noção do que significa estudar;

2- se dá mais atenção à maioria da segunda classe, os estudantes medianos, que não conseguem digerir mais do que arroz com feijão, pois não pretendem fazer vestibular ou arrumar um emprego que exija mais do que Ensino Médio, o professor estará condenado os alunos do primeiro tipo a uma verdadeira tortura intelectual: fazer duas operações matemáticas quando já se sabe fazer as quatro, durante todo o ano letivo, por exemplo. É uma verdadeira crueldade e só faz crescer no bom aluno o desânimo e a frustração;

3. Se dá atenção aos “maravilhosos” do terceiro tipo, o docente é obrigado a se transformar em uma mistura mal-feita de assistente social, psicólogo, advogado, amigo e confidente que não terá como dar aula de coisa alguma para ninguém.

Governadores, secretários da educação, pedagogos e nefelibatas acham que está tudo muito bom e, é claro, só pode ser culpa do professor não saber trabalhar com a heterogeneidade das salas de aula. Falam, mas ninguém conseguiu demonstrar que a situação não é a de um verdadeiro trilema e, não importa qual caminho o professor escolha, ninguém poderá culpá-lo pelo fracasso generalizado.

E não, eu não tenho uma proposta! Cabe a cada professor decidir e assumir o que faz.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Educadores ou “educa dores" - por Felipe Carota

OBS: Esta é uma adaptação, feita por Felipe Carota, de um texto de F. P. Castro, amigo do primeiro.

Vivenciar um dia de aula numa escola pública paulista é se deparar com uma dura realidade que afeta quase, se não todas, as escolas deste estado: A ausência do professor titular em sala de aula. Este problema não é de hoje, mais eu como estudante de escola pública lembro que desde minha 5º série sofro com este problema. (Hoje estou no 1º ano universitário, ou seja, minha 5º série foi há 10 anos).
A realidade que nos deparamos é triste e chocante. Aulas de História com professores de Matemática? Aulas de Química com professores de Letras? Pois é essa a política educacional que temos. Isto é um problema? Claro que sim!

Dentro da atual formação que as universidades preparam os “EDUCADORES” estes não recebem bagagem acadêmica para ministrar aulas transversais ou aulas que possam unir diversas disciplinas em torno de um determinado assunto (Ex. Estudar o Marxismo pelo ponto histórico, pelo caráter filosófico, seu aspecto sociológico e econômico dentro de uma mesma aula). O que vemos são professores formados com mentalidades “conteudistas” que não visam a assimilação do aluno com aspectos culturais, sócias e transversalidade do tema.

Mas o que um professor de Matemática pode causar de “dor” em um aluno que deveria estar estudando História? Toda! Não digo aqui a dor física, causada por uma lesão, um ferimento ou um tombo, mais a “dor” social que este aluno levará para o resto de sua vida. “Dor” social? O que é isso? O estado se preocupa em ter um professor em sala de aula, mais não com o tipo de professor ou que tipo de ferramentas o professor poderia ser para o aprendizado do aluno pela referida matéria. Assim, o aprendizado do aluno fica prejudicado. Sem aula, bem dizer, visto que este eventual se quer saber ser transversal tronando-se ferramenta para o aluno na assimilação do assunto trabalhado em sala, este aluno acaba ficando a margem do conhecimento. Com isso, sofre pela falta de apoio educacional, não desenvolvendo o conhecimento que deveria ter absorvido naquele momento.

Este tipo de prejuízo que leva o aluno à dor social, dor social de ser inferiorizado quando vê que seus rendimentos em olimpíadas, em avaliações, em competições acaba sendo inferior ao aluno da escola particular que teve o professor em sala de aula a todo tempo e que quando este estava ausente, havia quem o pudesse substituir, podendo levar a frente o conteúdo trabalhado. Com isso, este aluno se sentindo inferior acaba sem estímulos ao estudo, sem professor acaba sendo levado por influencias a conversa, a bagunça e a hostilizarão do ambiente escolar. Este aluno, por sua vez, buscara preencher o vazio que a educação e o conhecimento não preencherão em drogas, em prostituição e em atividade ilícitas de forma geral.

Esta é a dor social que os professores alimentam, a dor da exclusão do aluno de escola pública ao conhecimento, da exclusão deste nos bons resultados, estímulos e iniciativas educacionais. Não temos educadores, nos faltam profissionais comprometidos em educar e educar com seriedade e compromisso, profissionais capazes de por fim a este método que utilizamos de separar conhecimento por matéria e que sejam capazes de conduzir os alunos ao saber por meio de métodos diferenciados, permitindo que este aluno, mesmo na ausência de seu professor titular, possa junto do eventual dar seqüência no tema visto e assim, com desenvolvimento de seu saber estar preparado para todo tipo de atividade que meça, verifique ou avalie o conhecimento deste aluno.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Considerações sobre as Propostas Curriculares de São Paulo - por Gabriel Narkevicius

Inicialmente, gostaria de dizer que este texto se baseia em conclusões minhas a partir de duas discussões sobre este tema, realizadas em dois dias diferentes de aula da disciplina de Prática Geral I pelos estudantes da XLV Turma de História Diurno da UNESP Franca.

Qual a efetiva melhoria que temos no processo de ensino, quando temos algo que, ao invés de atuar como uma ferramenta de auxílio ao professor, se torna o fio condutor de suas aulas? O que muda quando uma ferramenta que possui, em seu próprio nome, a palavra ‘proposta’, se torna a base de avaliação do processo de ensino e aprendizagem, como também da abordagem dada aos conteúdos dados em sala pelo professor? O que temos por trás das Propostas Curriculares do Estado de São Paulo?

Ela homogeneíza o ensino no Estado? Sim, independente disso ser bom ou ruim. Ela padroniza o cronograma dos conteúdos temáticos a serem ensinados, mas infelizmente não pára por ai. Ao invés de apenas estabelecer este padrão acima, e digo padrão enquanto algo básico para todos, mas sem que o professor deva se limitar apenas a ela, a ‘Proposta’ vai além e faz justamente o oposto.

Pode-se perceber que a sua forma de abordagem tende a fazer com que o professor se apegue neste padrão enquanto suficiente para as aulas. Temos uma esquematização do que ensinar e como ensinar, que já prevê, dentro do próprio programa, as competências e habilidades que o estudante adquirirá após a aula de determinado conteúdo. Em outras palavras, a proposta já pressupõe que o estudante captará a relação entre os conteúdos programados, alcançando os objetivos propostos pela cartilha. E digo isto ainda sem ter levado em conta que, como se já não bastasse a existência desta 'atração' em favor de seu uso exclusivo em sala, esta questão ainda envolve outros dois problemas que só agravam a situação.

O primeiro parte da base estrutural do processo de ensino, diz respeito à ausência de uma consciência, por parte do professor, sobre sua própria profissão e seu sentido. Grande parte dos professores, públicos ou particulares, não possuem uma consciência efetiva sobre o sentido de ser professor, uma consciência de uma classe, como já abordado neste blog, com uma função de formação crítica para com o indivíduo, base da sociedade. A prova desta questão é vista todos os dias em sala de aula nas escolas, pela forma com que os professores realizam suas aulas, praticando a mera reprodução de conteúdo, sem nenhuma relação com a realidade do estudante.

A predominância desta forma de agir pelos professores acaba fortalecendo e muito a existência de uma cartilha, pois estes mesmos professores acabam se apegando a ela, pois está tudo ali, ‘mastigado’. Não vou negar que existam professores que fujam a essa maioria, e aproveito para parabenizá-los por isso, mas infelizmente o numero destes professores é pequeno quando comparado ao resto. Surge então uma relação de troca, onde a passividade dos professores faz valer a existência de uma cartilha, e ao mesmo tempo esta cartilha perpetua esta passividade.

O segundo problema existente já se opõe ao primeiro em relação à origem, pois ele vem de cima para baixo, das instituições do sistema educacional para o professor. Nos Cadernos referentes às direções das escolas, é apresentada a necessidade de ‘convencimento’ que estes mesmos diretores devem fazer a favor da utilização da cartilha em sala de aula pelos professores. Realiza-se uma imposição indireta, uma pressão do sistema de ensino sobre os professores para o uso da cartilha, que, somado à passividade e à forma de abordagem, permitem que as aulas se tornem uma mera reprodução dos conteúdos estabelecidos pela Proposta.

Bom, ao fazer este esquema, os organizadores da Proposta se esquecem de um único detalhe: o estudante. Na verdade, não somente o estudante, mas também sua realidade, sua vida. A forma com que se estabelece o ensino a partir desta cartilha faz com que a realidade do estudante fique distanciada do que é trabalhado em sala de aula. Não somente a realidade do estudante é deixada de lado, como a necessidade e o interesse do estudante em estar ali.

A abordagem definida pela Proposta parte de considerações sobre a formação de uma cidadania que não se relacionam com a realidade ou com a consciência do estudante, mas sim com uma consciência coletiva sobre um individuo inserido em um contexto amplo de sociedade. Em outras palavras, não se forma uma consciência individual, mas sim a manutenção de uma consciência coletiva que faz valer as mentalidades e práticas predominantes na sociedade.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Convite para Reunião Administrativa

Olá para todos:

Sexta feira, 14 de maio, às 11.30 da manhã, os integrantes do NACE estarão se reunindo em frente ao IV ano de História para discutir as seguintes pautas (a princípio):

- Abertura do grupo para novos membros;
- Organização das diretrizes do grupo;
- Organização da divulgação;
- Orientações referentes ao blog e
- quais pautas surjam no momento.

A reunião é aberta inclusive para aqueles que estão interessados em conhecer o grupo.
Lembrando que o grupo não é vinculado à UNESP, nem a nenhum professor, portanto, não conta como estágio, nem concede bolsas. Somos um grupo de discussão e nossas publicações estão no blog.

Mais informações, apareçam na reunião.
Sem mais;

Jr. Taz
Pelo NACE.

sábado, 8 de maio de 2010

Conexão: uma lição. - Por Jr. TAZ

Fala-se muito sobre gestão democrática, educação para a autonomia, contraversão da educação “formal” quantitativa, maneiras de formar um pensamento crítico coletivo, etc.

Há muito esforço teórico nesse sentido: são centenas e centenas de livros versando e circundando idéias e mais idéias, intelectuais se reúnem em mesas redondas, encontros, seminários, discursam aqui e ali, etc... O problema é finalmente levar à prática.

Na verdade, a prática está amarrada: se mexer um pouco já é suficiente para perceber como a disseminação de uma opinião pré-moldada alheia à crítica logra dar passos largos sobre a nossa sociedade, sobre o mundo todo.

Já mostrei meu argumento do porque não devemos esperar que o Estado reformule a educação, porque ela está apresentando resultados condizentes com a política do Mercado. Logicamente, se estamos interessados numa alteração radical da educação neste país, é necessário que isto parta de nós mesmos, da base.

Às vezes nos perguntamos se seria possível. Como enfrentar um sistema de um Estado, todas as proteções culturais criadas por ele, inclusive formando em nossas mentes uma mentalidade acrítica de defesa desse Estado, dessas políticas que pulverizam nossas relações político-sociais basistas. Qual caminho deveríamos seguir? Como gestar uma coisa nova, que pode vir a não dar certo? No meio das dúvidas, frente ao abismo do imponderável e do medo, ficamos estagnados, abaixamos as cabeças, e aceitamos o martelo que paira sobre elas.

Alguns corajosos esquecem-se dos limites do imponderável e fazem. Aliás, essa é uma coisa que falta em muitos de nossos intelectuais: a AÇÃO. Coordenar TEORIA e PRÁTICA é uma das coisas mais difíceis no longo caminho de nos tornamos verdadeiramente seres humanos que se orgulhem de carregar esse rótulo. Penso que é isso que Oscar Wilde quer dizer quando sentenciou “Viver é uma coisa rara. A maioria apenas existe”. E de alguns corajosos que falarei, ao longo do tempo que escreverei neste blog.

Quando o Tio B. (Nosso professor na UNESP) me chamou para conhecer o cursinho “Conexão”, em Ribeirão Preto, achei interessantes as características: os alunos participavam da construção das aulas, os conteúdos eram discutidos em reuniões administrativas, era voltado para alunos de baixa renda, professores voluntários, funcionando numa situação complicada, dentro de um casebre que é patrimônio municipal, no mesmo terreno que uma multinacional que não gosta muito deles, mas que apesar dos problemas tinha aprovação razoável, e o principal: não tinha uma formação meramente quantitativa, mas qualitativa, uma verdadeira formação humanística, gerando consciência crítica, educando para participar, e não simplesmente absorver o que quer que seja que o vestibular peça e pronto. Apesar dessa fantástica apresentação, fui sem grandes expectativas, principalmente pelo que tinha em mente sobre os cursinhos comunitários que para mim nao tinham nada de comunitários.

Não me lembro muito bem o dia da semana que foi, mas lembro bem da dinâmica, pois foi o que me surpreendeu. A “aula” era a montagem de uma peça de teatro que mostrasse as relações entre uma família rica, outra classe media, outra camponesa com o candidato à prefeitura, além de suas relações familiares e com seus (possíveis) empregados. E não só a montagem, mas também sua apresentação, na mesma aula. Lembro que eu estava cético, mas nem de longe deixaria de considerar a possibilidade de aprendizado de uma ação como aquela. Era fantástico, uma grande idéia e... Aplicada! Entrei de cabeça e participei (até improvisei no final!). Mas o mais interessante é ver como eles teorizaram a peça, encaixaram os temas de lutas de classes, dominação cultural, demagogia, e muito mais com tamanha desenvoltura. Tenho certeza que a maioria das pessoas do cursinho (privado) do qual fiz parte não conseguiria realizar uma situação com tamanha qualidade e... Com solidariedade!

Num cursinho privado, mesmo que você não seja o concorrente direto daquele seu colega de classe, acontece certa rivalidade. Parece que a sensação entre aqueles jovens é a de que se você acumular mais informações que os outros, você passa no vestibular – o que não é uma verdade! E sabíamos disso, de certa forma. Mas o clima competitivo, copista, de memorização intensiva nos fazia mais vestibulandos que amigos. Não é o que se apresenta no Conexão. O clima é de compreensão da situação do outro: a maioria ali trabalha ou não tem condições de estudar em casa durante o dia, e quando estão juntos, proporcionar a discussão é abrir um canal pra aprimorar tanto a si mesmo quanto aquilo que o outro pode não ter percebido. O estimulo à opinião é algo que não se vê num cursinho privado, nem no ensino formal sob qualquer situação, e nem mesmo na faculdade. Emerge quem pode; quem consegue. Os outros servem de mar.

Seria uma consciência de classe, como a que o Gabriel falou alguns posts atrás, mas partindo dos alunos?

Voltando. Saí da aula emocionado. Conversei também com alguns alunos, e notei a realidade difícil de alguns deles, e o reflexo do sonho de passar no vestibular e conhecer novos mundos, proporcionar novas realidades para seus familiares... Como eu um dia também tive, e hoje vivencio.

Voltei no sábado seguinte para a reunião administrativa, da qual os alunos também participam. Nem todos os alunos vão, muitos porque trabalham, outros porque não podem, etc. É lá que professores e alunos resolvem os problemas que aconteceram durante a semana – muita conversa? Tá prejudicando o coletivo! Tem alguém faltando muito? O que tá acontecendo? Porque o pessoal tá faltando na faxina coletiva? - e definem as abordagens do que será estudado durante a semana (mas há um cronograma maior, pré-estabelecido, por módulos). Lavagem de roupa suja acontece, mas é interessante porque se nota uma situação política, os indivíduos trabalhando pelo coletivo.

Marquei uma reunião pra segunda feira imediata com o NACE, precisava espalhar as boas novas, e o fiz com um entusiasmo que contagiou o pessoal. Porém, estávamos no fim do ano, muitas provas, e o pessoal não tem mobilidade pra Ribeirão Preto como eu. A coisa esfriou um pouco, mas foi graças aqueles dias que tive boas idéias e reforcei certos pensamentos. Ainda fui a mais uma reunião, eu acho, em 2009.

Depois de alguns meses, mesmo sob pressão de outros compromissos, principalmente acadêmicos, voltei a me dedicar aos meus interesses, dentre eles, os educacionais, e também ao Conexão.

Turma dividida, alguns conhecidos do ano passado, novas caras... Mas o mesmo entusiasmo, mesmo nos que não passaram. Lógico, um pouco de cansaço, também não consegui passar de primeira, sei como é. Mas, como eu, agarrar-se ao sonho beira à necessidade... Lembro de quando estudava no CECAS (outro cursinho, que tinha pretensões comunitárias, mas que não segurou bem, em minha opinião) e, cansado, final de ano, pouco animado com o vestibular, ouvi o Batata (que era professor no CECAS e que também dá aula no Conexão, um grande sujeito!) falar sobre como seria a vida universitária, que valia a pena continuar, contou a história dele, demos muita risada, mas sentimos, no fundo, que não podíamos parar; não era o vestibular que importava, era a vida. Não podíamos estagnar. Passei no vestibular.

Boa aula a de ontem: o Danilo juntou a galera e discutimos um texto de Marx e outro do Paulo Freire. E dessas discussões fomos caminhando, passando por formas de produção, relações de trabalho, democracia ateniense e moderna, direta e indireta, participativa ou não, sustentabilidade, empresas que usam selo verde para conquistar clientela, mas que prejudicam o meio ambiente por outro lado, educação e Estado, e culminamos na Pedagogia da Autonomia, que era justamente o que estávamos fazendo ali, estávamos vivenciando a teoria. Eis que estávamos vivos, e não apenas existindo... Não tem como não aprender se VOCÊ está construindo o pensamento: há uma complexidade de pensamento, uma ecologia no que se aprende, lembrar de uma coisa é lembrar-se de relações, o saber é ampliado, não é mais objetivo, mas subjetivo.

Na reunião administrativa de hoje, ações práticas de alta relevância, as quais não convém falar ainda. No entanto, mostra qual é o caráter dessa educação que ali se gesta: a prática. Nada daquilo que não sirva para melhorar aquilo que me torna um ser humano melhor para a minha vida e da minha comunidade não faz sentido. As teorias só têm uma função, que é melhorar nossa vida através da melhor aplicação prática possível.

Enfim. Sei que me alonguei demais. Este blog tem por finalidade discutir nossas percepções sobre possibilidades educacionais. E bem que eu demorei demais para começar a falar sobre o Conexão (mas vocês verão muitos textos sobre ele daqui pra frente). E antes que se diga que é preciso sentar e pensar no que vamos fazer, estão aí experiências responsáveis como o Conexão para nos dar exemplo de que não há saída: a mudança é de baixo pra cima, é pela educação e é principalmente pela AÇÃO.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Estado e Educação Popular - por Junior Taz

Educação é algo que vem de fora. Pode ser encarada como fragmentos da cultura humana que, nem sempre de forma ordenada, são repassados aos indivíduos que participam de determinada sociedade; ou seja, não sai do indivíduo, mas no máximo é complementada por ele.

Em sociedades ditas mais simples (mas que nós sempre pensamos “puxa, como seria difícil viver como eles!”) a educação tem um viés mais tradicional: o repasse dos fragmentos da cultura humana são feitos sob medida das necessidades dos indivíduos em seus graus de participação naquela sociedade; pode-se muito bem dizer que isso é uma educação estamental, mas não penso que os outros setores tenham intenção de alterar a situação: é tradicional, mudar isso faz perder o sentido.

Já nas sociedades ditas mais complexas sabe-se que o Estado geralmente se apodera do monopólio da violência. Se sabe por dedução que essa violência não é meramente física, ou da ameaça, mas também a castradora violência do monopólio de um viés educacional – mantenedor do status quo. Pode-se dizer que a educação privada faz o mesmo, mas ressalto que não é o que está sendo dito que importa, mas o modo como está sendo feito, ou seja, de cima pra baixo, e massivamente – formando massas, e não indivíduos.

Por educação libertária penso nas possibilidades, sempre extremamente difíceis, de extrair da mais rústica ostra a mais fantástica das pérolas. Fazer o ser humano enxergar-se enquanto indivíduo, enquanto ser com possibilidades de ativar a sociedade, de alterar seu status mesmo fora do sistema, mesmo intentando romper com o sistema. E isso não se impõe de fora: mostra-se alternativas, exemplos, motivos, e dessa maneira sempre tão singela – pela conversa, não pela aula – é que se mostra a essência humana na existência sempre subjugada.

Por isso o Estado não promove uma educação libertária: seria contra-senso, e seu suicídio. O Estado sobrevive das políticas massivas, do pensamento coletivo que tende ao irracional (não me entendam mal: irracionalidade não tem nada a ver com burrice): promover uma educação onde cada indivíduo entenda sua existência como expressão do ímpeto de alteração é um perigo para um sistema apoiado em corrupção, paternalismo, clientelismo, falsidade e simulação de democracia.

Indivíduos ativos pensam, e quando pensam questionam. Se não acham as respostas eles não tem nojo de enfiar a mão na lama em busca delas.

Já ouvi dizerem que o Estado promove uma educação, senão democrática, ao menos próxima disso, porque tenta mostrar o máximo de caminhos – expressão das matérias que aprendemos nas escolas - tão diversas, não é? Fora a inserção do simulacro de sociedade que se promove nas salas de aula – pois repudio completamente tais interpelações!

Não vejo democracia alguma em obrigatoriedade de matrícula nas escolas que o Estado entende por oficiais. Também não é democracia no sentido que se importa do termo que haja inúmeras matérias se elas são meramente tecnicizadas! Não se aprende História para questionar as ações humanas, mas para se obter curiosidades dos grandes nomes! Não se aprende geo-política para criticar os acontecimentos mundiais, mas para saber o que passou no jornal do ano retrasado, a matemática começa com laranjas e quando nos damos contas são laranjas irracionais, a física e seus carros e colisões, até mesmo o ensino da nossa língua não passa pela lógica: prioriza-se as exceções, quando são excepcionais! Esperar que cada aluno pense por si mesmo é desvalorizar a comodidade e a preguiça do espírito humano frente à tela de uma televisão. É obrigação dos EDUCADORES (e não apenas dos profissionais da educação) tomarem partido para ajuda-los a questionar para entender. O Estado suicida é um sonho.

Quanto ao absurdo do simulacro social numa sala de aula é o prazer dos sadomasoquistas. Apesar de que no mundo social que se espreita hoje para a grande maioria das pessoas, a sala de aula é uma lembrança cômoda: os professores fingem que ensinam, sozinhos, na frente da sala, os alunos fingem que aprendem, sozinhos, em suas carteiras, e é disso que se vive no depois: falar sem ser ouvido, escutar sem ouvir. Mesmo a crítica é desvalorizada, não é cultivada. Preguiçosamente enterrada nas dores da ignorância, regada com o medo do rechaço – quase sempre certo, ameaçadoramente próximo. Até a arquitetura das salas é opressora. “Cinqüenta alunos calados” não é, de forma alguma o prelúdio de uma sociedade deliciosamente tentadora, apenas o sonho de um gerente de alguma fábrica de sapatos, de roupas, ou qualquer coisa do gênero.

Enfim, não me alongando muito mais, pois o tema é prolífico e em grande parte, intuitivo, ressalto a importância da ação dos EDUCADORES, para uma educação contrapontual à ação da educação FORMAL do Estado: que seja educação informal o nome, contanto que esteja disposta a arrancar dos olhos, ouvidos e bocas dos alunos para torna-los estudantes para que mais que aprendam, que compreendam o mundo a fim de muda-lo antes que seja tarde demais. Fugir disso é suicidar-se em oferenda ao Estado.