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terça-feira, 12 de outubro de 2010

A Arte de Envelhecer - por Bianca Nogueira Mattos

A oficina “A arte de envelhecer” acontece toda semana, as quartas-feiras na Unati, Universidade Aberta a Terceira Idade da Unesp, Campus de Franca. Ela objetiva promoção de qualidade de vida, autonomia, liberdade, socialização de conhecimentos e participação política a partir da criação, conhecimento e interpretação de obras artísticas.

As reuniões acontecem com os alunos unatianos e a estagiária do Serviço Social, Bianca N. Mattos, com o auxílio da estagiária Cristiane Poltroniei, e buscam respeitar os princípios éticos da profissão (rompimento de práticas burocráticas, aproximação usuário-profissional, perspectiva tranformadora, defesa do acesso a direitos e informação, relações horizontais, incentivo a participação política) assim como alguns direitos constitucionais (liberdade de expressão, participação política, educação continuada, cultura, lazer, informação).
A estética faz parte do homem em sua essência, é um elemento fundante do ser humano genérico e a arte é uma de suas ferramentas, assim como as atividades lúdicas, que facilitam o aprendizado e possibilitam maior abertura dos integrantes de um grupo para participarem e construírem juntos um objetivo maior, de interesse comum, ou seja, trazer sentido a atividade educacional ou sócio-educativa, como sugere a educação crítica de Paulo Freire.

O trabalho artístico constitui-se também como mecanismo de expressão e acontecerá com os instrumentos da pintura, do cinema, do teatro/teatro de fantoches, da música, da fotografia e da literatura, debatendo temas como questão de gênero, liberdade, família, questão social, movimentos e lutas sociais, saúde, dentre outros.
Na primeira aula, com duração de uma hora e meia, foram apresentados a princípio os objetivos do curso e o plano de aulas, de forma aberta, esclarecendo a possibilidade de alterações de acordo com a realidade dos participantes. Seguidamente foram trabalhados conceitos de arte como método educativo, como direito universal e como constituinte humana. Foram apresentados os sentidos que podem apreender a arte e as diferentes formas de arte, assim como a proposta de educação horizontal e crítica e da liberdade de expressão como fundamental para a cidadania, para a amplitude do ser e para a efetivação da democracia.

Temas como ditadura, censura, repressão e relatos de experiências desses períodos no Brasil foram levantados a fim de questionar esses sistemas e a importância da liberdade e da arte como expressão de sentimentos, idéias, relevâncias sociais e manifestos.

Outro aspecto enfocado na aula foi o direito universal a informação, pois essa é constituinte no exercício da democracia e da cidadania. Consideramos também a arte como mediadora de informação.

Exibimos um curta-metragem intitulado “O Semeador Urbano” que discorre sobre fotografia e meio-ambiente.

O gênero artístico trabalhado na presente aula foi o visual, contemplando fotografia e artes plásticas. Os alunos produziram telas individuais abstratas e concretas, enquanto escutavam música clássica (Bethoven, Mozart, Chopin). Eles próprios analisaram a música clássica como promotora da imaginação, da sensibilidade e das emoções. Também declararam que a atividade os fazia pensar na sociedade e em como nos esquecemos de nós mesmos nas atuais condições de estresse, trabalho alienante e cansaço, onde a população se preocupa mais com aspectos individualistas e com o consumo e adquirem valores transmitidos pela mídia e pelo próprio cotidiano imposto, do que com suas próprias percepções, vontades e relações pessoais.

Pretendemos, em alguma próxima aula, realizar a pintura de um mural, de forma coletiva, para ilustrar a identidade do grupo e propiciar a atividade cooperativa e o rompimento com o individualismo exacerbado que vivenciamos atualmente.

Por fim, trabalhamos um pouco com a fotografia, que os alunos analisaram de grande importância, pois muitas vezes têm dificuldades de participarem de algumas situações cotidianas por não terem tido ainda aproximação com algumas tecnologias, hoje bastante usuais.

Foi interessante a discussão sobre a fotografia não apenas como retrato da realidade, mas também como manifestação artística, passível de relevância social, desde o momento da escolha do objeto a ser fotografado até a técnica e escolha da captura da imagem.

Os alunos e as estagiárias tiveram um diálogo bastante aberto, que excedeu as expectativas iniciais. Os unatianos apreciaram a amplitude de seus imaginários a partir da técnica de pintura, pois o ideário muitas vezes é abandonado na sociedade do capital onde o trabalho deixa de ser parte da gênese humana e sustentável e passa a ser alienado, explorado, imposto e fetichizado.

Na segunda aula da oficina “A Arte de Envelhecer”, foram elencadas obras nacionais e internacionais, para serem objetos de reflexão e interpretação de todos os participantes.

As obras foram contextualizadas historicamente, sendo considerados os períodos em que foram produzidas e qual a realidade social deles.

Foram analisadas as relevâncias sociais de cada pintura, incluindo suas manifestações sentimentais subjetivas e representação explícita de cultura cotidiana e entraves sociais.

Os artistas estudados na aula foram: Cândido Portinari, Pablo Picasso, Gustav Boulanger, Edvard Munch, Daumier e os muralistas do Muralismo Mexicano, Diego Rivera, José Clemente Orozco e Davi Alfaro Siqueiros.

A partir das imagens, evidenciamos, coletivamente, o caos da guerra, as mudanças climáticas, a desigualdade de classes, a desigualdade de gênero e etinia, a defesa do Estado laico, a defesa e democratização da cultura local e a repressão do Estado sobre a expressão política do povo.

O enfrentamento ao preconceito de diversas categorias (racial, sexista, homofóbico, classial) instaurados na sociedade atual, foi também debatido.
Ainda assim, a principal discussão foi acerca da importância de reflexão e questionamento da própria realidade em que estamos inseridos e do que nos é apresentado por esta, e do reconhecimento do ser humano genérico, da categoria humana e da identidade coletiva social.

Alguns sentimentos foram despertados nas alunas, segundo declaração das próprias alunas, dentre eles o de revolta, angústia, aflição, alegria, romance, desespero, encontro pessoal e solidão.

No quadro de Edvard Munch, O Grito, por exemplo, uma das alunas declarou ter interpretado que o personagem gritava consigo mesmo, buscava por si próprio, já que estava num lugar que lhe dava impressão de distante e isolado e declarou ainda que esse sentimento lhe despertava identificação, pois muitas vezes se sentia dessa forma.

As pinturas que mostravam a repressão feminina e a desigualdade de gênero tocaram o ínfimo das participantes, que começaram a refletir sobre situações atuais de preconceito de gênero e a debater sua origem e instauração na sociedade, além de suas formas de combate e enfrentamento.
Por fim as unatianas disseram que a aula superava suas expectativas, pois ia de encontro com o conhecimento continuado e não subestimava o idoso como incapaz, limitado ou descartável, como muitas vezes é visto pela sociedade.

Na terceira aula nos apropriamos da música como método e teoria. Composições de nomes como Raul Seixas, Geraldo Vandré, Chico Buarque, Zé Ramalho, Caetano Veloso, Gabriel Pensador e o grupo Face da Morte foram escutadas e debatidas.

Refletir sobre a mensagem explícita e subjetiva das canções instigou um diálogo acerca de educação, efetivação dos direitos da população, ditadura, democracia, desigualdade social e sua conseqüente desigualdade de oportunidades, tentando desmistificar a culpabilização do indivíduo e a criminalização da pobreza.

Um dos pontos que devem ser destacados das atividades é o de que os alunos declararam que as oficinas têm sido divertidas e construtivas. Momentos em que o aprendizado ganha sentido e acontece de forma prazerosa e desejada.

Concluímos assim que as atividades possibilitam grande crescimento para todos seus participantes, tanto alunos quanto estagiárias e tem atingido, assim, seus principais objetivos.

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